sábado, 25 de setembro de 2010

Faz de conta

Faz de conta que ela era uma princesa azul pelo crepúsculo que viria, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, faz de conta que ela amava e era amada, faz de conta que não precisava morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus, faz de conta que ela não ficava de braços caídos quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que era sábia bastante para desfazer os nós de marinheiro que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua, faz de conta que ela fechava os olhos e os seres amados surgiam quando abria os olhos húmidos da gratidão mais límpida, faz de conta que tudo o que tinha não era de faz-de-conta, faz de conta que se descontraíra o peito e a luz dourada a guiava pela floresta de açudes e tranquilidade ...
- Clarice Lispector

3 comentários:

  1. Faz de conta que todas as pessoas seriam gratas pelo o que tem e não sonhariam por algo que fosse impossível.

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  2. Parabéns pelo texto publicado e parabéns pela originalidade do blog *

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